BRASIL, TRISTEZAS E ALEGRIAS PARTE ll

A Constituição Cidadã de 88 é considerada o grande momento de contentamento político que nós tivemos, onde finalmente os valores institucionais republicanos se adequaram às nossas maiores  aspirações libertárias, uma vez que após esse momento, ficamos inteiramente livres legalmente para uma ampla eleição nacional que viesse a consagrar definitivamente as nossas liberdades políticas no campo democrático. O que ocorreu definitivamente com as eleições de 89.

O processo eleitoral desse período foi riquíssimo, principalmente pelo alto nível intelectual dos homens que se apresentaram para o pleito, Ulisses Guimarães, Mario Covas, Leonel Brizola, Ronaldo Caiado, Miro Teixeira, e dentre muitos outros de menor expressão, os dois que chegaram ao segundo turno das eleições, Luiz Lula e Fernando Collor. O primeiro era o representante de uma centro  direita mais conservadores, mas sobre o segundo, ainda pairava uma certa desconfiança do fantasma comunista, que talvez tenha influenciado no resultado final, a vitória apertada de Fernando Collor.

Foi um governo que inicialmente  representava muitos dos nossos ideários antropológicos de festa e de contentamento social e político, afinal de contas, Collor era o primeiro presidente da república da fase pós constitucional e pós democracia constitucional. Também por essas razões, o governo  tinha muitos motivos para caminhar relativamente muito bem. Inclusive por causa das suas muitas privatizações, que deram início ao processo de modernização, que gerou partes consideráveis da realidade de um país que se tornou pleno na áreas do comércio exterior e das  telecomunicações. Porém, algumas posturas relativamente desastradas como o confisco das poupanças dos cidadãos, a falta de articulação do governo com o Congresso Nacional, que levou Collor a presidir o país excessivamente por decreto, e acima de tudo, por causa da descoberta aparentemente ilícita das relações entre a presidência da república e o tesoureiro de campanha de Collor, Paulo Cessar Farias, denunciado pelo seu próprio irmão, Pedro Collor, o nosso primeiro presidente da república de um país que se tornara plenamente democrático veio a sofrer um bem sucedido processo de impeachment.

O impeachment de Collor, apesar da muita indignação que gerou por causa do suposto esquema de corrupção, foi também um processo muitíssimo festivo, que também fez vir a tona todos os nossos imaginários de alegria antropológica, que nós vivenciamos em vários momentos, principalmente desde a chegada da família real portuguesa no nosso território. Esse entusiasmo e alegria esfuziante, foi representado nessa fase, principalmente pelos famosos "cara pintada", que eram jovens que se reuniam em praticamente todo o país com os rostos pintados para pedir o impeachment do presidente da república.

Com a realização do impeachment, assumiu o vice presidente Itamar Franco, com uma agenda mais tímida e conservadora, baseada sobretudo no fortalecimento da indústria nacional, que ficara muito descontente com a flexibilização do comércio internacional da fase Collor. Mas acima de tudo, havia um fenômeno social, político e acima de tudo econômico a ser vencido no Brasil, a inflação. Para isso, Itamar Franco convocou para ministro da economia, o intelectual e renomado  sociólogo Fernando Henrique Cardoso. FHC, como passou a ser popularmente conhecido, organizou o Plano Real, e finalmente, estabilizou a moeda nacional e acabou com o processo de inflação galopante, que nos acompanhava desde o governo dos militares no poder. Catapultado pela popularidade do Plano Real, Fernando Henrique se candidatou às eleições de 93, e mais uma vez Lula perdeu no segundo turno, e Fernando Henrique Cardoso se elegeu com uma boa margem de votos em relação à Lula.

O governo FHC, continuou dando vida ao processo de privatizações e modernização econômica que iniciara lá com Fernando Collor, seguiu tomando medidas muito acertadas que favoreceram a continuidade da estabilização da nossa moeda, o Real. Razão pela qual ele reelegeu no pleito de 97, e mais uma vez, Lula perdeu no segundo turno. Mas durante esse período, os avanços na área social foram bem mais tímidos do que se esperava. Por isso a candidatura Lula, que vinha sendo viabilizada desde as eleições de 89, finalmente chegou à presidência da república.

Como não poderia ser diferente, a eleição de Lula gerou muitas espectativas positivas, afinal de contas, o novo presidente por causa das suas origens humildes, por causa da sua história nos movimentos sindicais do ABC paulista durante o processo da reabertura política, representava a chegada da classe trabalhadora no poder. E como não poderia ser diferente, em mais uma oportunidade, os nossos imaginários de alegria antropológica como nação brasileira alcançara mais um dos seus apogeus com a eleição do operário e torneiro mecânico Luiz Inácio Lula da Silva.

O governo Lula tinha um caráter muito festivo, com isso, ele também  representou a  nossa alegria antropológica real e imaginária, afinal de contas, simbolizava com as origens do Lula o povo no poder. Porém isso não deixava de ser contraditório em muitos aspectos, apesar dos diversos avanços sociais trazidos na gestão petista. E uma dessas contradições foi simplesmente a sombra da corrupção que sempre acervos os seus quadros, coisa que o PT contraditoriamente, sempre se notabilisou como o maior dos  combatente desde a sua fundação, principalmente no legislativo brasileiro. Uma outra contradição do governo petista foi a gestão conservadora na economia, que promoveu o maior lucro de bancos e instituições financeira da História brasileira. Nesta fase, as corrupções geraram muitos rumores de impeachment que envolvera o afastamento do presidente. Mas o apoio dessa elite econômica,  muitas razões internas, e acima de tudo geopolítica, deram a Lula a possibilidade de se utilizar da alta das comodities no mercado internacional para investir em políticas sociais, onde o governo fomentou uma melhor distribuição de renda no pais, para combateu a fome principalmente no interior do Brasil, aumentou a média da escolaridade dos brasileiros, principalmente investindo na inclusão dos mais carentes nas universidades públicas e privadas, elevou o país a uma média de apenas 4 por cento de desemprego, acumulou cerca de três trilhões de reservas na nossa economia se juntarmos o caixa do Tesouro, as reservas internacionais e o Banco Central,  e com a política externa, que dava prosseguimento às agendas humanitárias e ambientais do mundo, o executivo gerava no governo petista um verdadeira impressão de sucesso nas relações internacionais. O resultado disso tudo não poderia ser diferente, uma reeleição com vitória sobre Geraldo Alkmin ainda no primeiro turno e a maior popularidade de um presidente da república no momento da sua saída. Popularidade essa que também redundou na primeira vitória de Dilma Rousseff sobre Geraldo Alkmin e uma vitória apreçadissimas na reeleição da presidenta quando a mesma superou Aécio Neves no segundo turno nas eleições de 2013.

Durante o governo Dilma, a partir do segundo mandato, o PT pagaria o preço mais alto da sua história por ter se corrompido durante os seus governos, pois isso foi somado a uma grande crise que se abateu sobre o país, principalmente durante o segundo mandato do governo Dilma Rousseff por causa principalmente da baixa internacional no preço das comodities. E essa realidade deu as munições que a oposição precisava para atacar o governo. Por outro lado, além da indignação que tomou conta de vários setores da sociedade, o PT já não tinha mais o apoio das elites financeiro, que continuaram a procura do aumento dos seus investimentos, mas temia que por razões da crise, a história do Partido dos Trabalhadores em fazer política social pudesse minar os seus planos.

Dilma também nunca fora de muitos amigos, tinha uma clara dificuldade de fazer articulações políticas, e o que é pior, durante a fase do seu governo, pegou um momento onde as esquerdas e os movimentos populares se encontravam quase totalmente desmobilizados. E isso também porque durante a ampla aliança que o PT fez no governo Lula, que desarticulou quase por completo as oposições, tornou os movimentos populares tão inativos, que quando o PT precisou das ruas para apoiar a presidenta contra o impeachment, o PT praticamente quase  só via a força da oposição nas ruas. Essa dificuldade ficou muito clara durante as manifestações de 2013, pois aquela era a hora do PT se aproximar de vez dos movimentos populares a partir do governo Dilma, que era o PT no poder. Mas o governo tomou medidas algumas importantes como o Programa Mais Médicos, mais foi muito tímido na reaproximação dos movimentos populares, que inclusive, foram muito reprimidos. Era o momento do PT se aproximar de um momento de puro entusiasmo por pautas diferentes e também por um país melhor e aproveitar mais um apogeu histórico de otimismo e alegria antropológica do nosso imaginário social, as manifestações de 2013.

Com o impeachment da presidenta Dilma assumiu o vice Michel Temmer, que teve o mérito de colocar a controvertidos reforma da previdência e a reforma trabalhista em pauta.

A decepção com o PT, acompanhada da crise política e econômica que ocorreu durante o governo Dilma Rousseff, atingiu em cheio a nossa autoestima como nação e acordou um sentimento antipetista que estava pronto para ser ocupado por alguém. Mas quem ocuparia esse espaço se desde a época das investigações sobre o Mensalão até a Operação Lava Jato, políticos tradicionais, do alto e do baixo clero apareciam envolvidos em corrupção? Quem se apropriaria de um mais novo neomoralismo emergente pós petismo? Foi nesse cenário que apareceu o exótico deputado Jair Messias Bolsonaro ocupando teoricamente esse sentimento de moralismo e de  antipetismo que nós estávamos vivendo, e com certeza, ainda perdura.

Porém como o então deputado nunca fora uma figura política das mais simpáticas, inclusive com uma fortíssima fama histórica de racista, machista, estúpido, ignorante e etc, ele atraiu por outro lado, um antibolsonarismo que na realidade sempre existiu. Esse cenário produziu um tipo de eleição, a eleição de 2028, que foi muitíssimo diferente de todas as eleições para presidente que nós tivemos até então, pois essa foi a eleição da negação, e não dá afirmação. Ou seja, essa não foi a eleição do eu voto neste candidato porque eu gosto dele e me identifico com as suas ideias, mas sim essa foi a eleição do eu odeio este candidato por isso eu vou votar naquele outro. Resumindo, foi uma eleição da raiva, foi a eleição do ódio e foi uma eleição de um Brasil muito diferente que tem se apresentado a nós e ao mundo de uma maneira muito distinta, pois o que nós temos visto hoje é um Brasil de uma estranhíssimo e profundo entristecimento antropológico, cheio de ressentimentos e que tem cultivado vários espaços de retrocesso político.

Nada pode  ser mais destrutivo que o ódio interno, que o ódio político e as suas alianças com frustrações pessoais que possam se encontrar  da coletividade. Razão pela qual, é importantíssimo a construção de imagens nacionais de otimismos, de alegria e de contentamento como nação. Isso faz com que demandas de frustrações internas alocadas em setores de uma sociedade não se transformem de uma hora para outra em fatos políticos de ideologização do ódio e das nossas frustrações pessoais. Sobretudo em um momento como o que nós temos vivido agora, onde o país encontra_se praticamente sem nenhuma representação social de alegria e contentamento antropológico. Sequer imaginário.

Eldon de Azevedo Rosamasson

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