CRÔNICA E FILOSOFIA: A MÃO QUE BALANÇA A JUSTIÇA
Uma das coisas mais curiosas no Brasil, e talvez seja algo que não seja compreendido na maioria dos países do mundo, é que nós sempre dissemos que aqui neste país tem "lei que pega" e tem "lei que não pega". É como se sempre quando uma legislação entra em vigor, o dia a dia da sua execução dependesse de uma mão externa que balance o berço de um bebê as vezes meio adormecido, que é a justiça brasileira, a exemplo da perversa e misteriosa babá Payton, que balançava o berço do bebê da casa da família Berthon no filme A não que balança o berço. E agora nós estamos diante de um caso que representa muito bem este espírito seletivo do nosso senso de justiça, que é a escolha do desembargador Kaio Marques para substituir o ministro Celso de Melo no STF.
Quando o quase ministro da educação Carlos Alberto Decoteli foi anunciado como o novo ministro da educação do governo Bolsonaro, em substituição ao folclórico Abraam Waintraub, e foram descobertas inconsistências no curriculum do quase novo ministro, foi feito um verdadeiro carnaval em torno do assunto. Afinal de contas, toda a imprensa achou um verdadeiro absurdo o que ele fez e caiu de pau em cima do negão, que sem clima nenhum para continuar, renunciou cinco dias depois da nomeação.
Mas neste exato momento que se chama agora, também foram encontradas inconsistências no curriculum do atual ministro indicado para STF, Kássio Nunes Marques, a respeito da sua formação, pois o mesmo dizia ter pós graduação na Universidade de La Corunha na Espanha, mas a universidade negou que isso tenha ocorrido, uma vez que a mesma não oferece o curso que ele diz ter feito. Inclusive, ninguém pode se tornar um pós doutor se ainda não fez o curso de doutorado, que segundo as notícias que estão veiculadas na imprensa, ele também não cursou, apesar do Kássio ter dito que o cursou. Será dois pesos e duas medidas? será isso o famoso racismo cultural, uma vez que o Decoteli é negro e o Kássio Marques tem uma mestiçagem de cútis mais clara e cabelos levemente mais alisados? ou será que nós temos aí movimentos mais sutis que representam a mão que balança o berço desse bebê muito sonolento, que é a justiça brasileira?
De um modo geral, as mãos que balançam todos os setores e todos os berçários da nossa maquinaria social na Modernidade é "maquina capitalista", que precisa urgentemente ser compreendida no seu novo formato. Pois lá no passado, entre os séculos XV e XlX, quando a economia capitalista dava os seus primeiros passos desde o Mecanicismo experimental, ela se consagrou definitivamente com a industrialização da vida urbana entre os séculos XVlll e XlX. Porém no início, o capital como fabricante de bens materiais era muito mais participativo que o capital financeiro. Mas hoje pelo mundo, o principal lastro do Capitalismo é a valorização do dinheiro nele mesmo. Desta maneira, quando uma economia é especializada em tecnologia de ponta como é o caso da economia dos Estados Unidos, da Inglaterra, da Alemanha e etc, ela consegue se suparar, a despeito da financeirização econômica, por causa dos fortes mecanismos de defesa que ela possui, que são principalmente os investimentos macissos em pesquisa. No outro caso, quando uma economia investe eventualmente em inovação, mas sobretudo na produção de muitíssimos bens materiais como é o caso da China, ela também está de posse de um bom mecanismo de defesa perante à financeirização da economia, pois ao produzir demasiadamente na escala industrial tradicional, ela se torna um dos principais contrapesos na balança econômica de um mundo que investe cada vez menos na produção industrial de bens duráveis e não duráveis. Pois enquanto uma parte do mundo se volta para a tecnologia de ponta e a tecnologia limpa e enquanto outro lado do planeta se especializa em um capitalismo financeiro de serviço interno ubberizado, a China se projeta como uma espécie de cobertira material do mundo. Mas quando uma economia é muito parecida com a nossa, que não vê crescimento do seu parque industrial e na sua produção desde a década de 80, que não investe em tecnologia de ponta através de muitos protagonismo na pesquisa, na Ciências e na Tecnologia, ela acaba vivenciando uma espécie de ubberização econômica através dos monopólios da indústria dos serviços de trabalhos cada vez mais precarizados. Neste caso, são as relações com a maneira como esse capitalismo financeiro tem aterrizando por aqui, que as nossas forças políticas tem se movimentado no país, inclusive a ponto de promover a justiça ora de uma maneira ora de outro jeito de acordo com cada novo movimento histórico de especulação econômica, que em nome da moralidade também já realizou o impeachment de dois presidente eleitos.
Teto de gastos, esse é o nome da babá traiçoeira que balança o berço das forças políticas no Brasil de hoje, pois como a nossa especialidade hoje é muito mais a produção de comodities, e muito menos ter um projeto industrial e científico de desenvolvimento, o país, que não tem os mesmos mecanismos de defesa dos Estados Unidos e da China, se torna a cada dia mais um paraíso financeiro do capital especulativo. Ou como diz o título de um dos livros do doutor Ladislaw Dowbou, do "capital improdutivo." Sendo assim, quem investe mais no Brasil de hoje, investe massissamente para auferir de juros, principalmente através dos títulos da nossa dívida pública. Porém se o Brasil furar o tal teto de gastos, poderá haver uma desvalorização dos títulos dessa dívida, que está de posse de muitíssimo dos maiores investidores do Brasil e do mundo. Então meus amigos, esqueçam essa ideia de justiça capenga de que o Brasil não pretende mexer no teto de gastos por uma questão de equilíbrio fiscal para o bem de todos. Até porque segunda a Instituição Auditoria Cidadã da Dúvida Pública, presidida pela doutora Maria Lúcia Fatorelli, mais de 40 por cento do orçamento da União está comprometido com o pagamento de dúvidas públicas. Por isso a frasezinha mágica, teto de gastos, cujo o interesse maior não é promover a qualidade do serviço público aos cidadãos brasileiros, e sim honrar os compromissos com credores e investidores. A pressão que está sobre o ministro da Economia Paulo Guedes, advém desses investidores e do tipo de capitalismo que aterrizou definitivamente por aqui, que não se alimenta de ciência e de tecnologia de ponta, que não se nutre do crescimento do nosso parque industrial, mas que se alimenta vorazmente das "políticas fiscais suicidas do Banco Central" como diz a doutora Maria Lúcia Fatorelli.
Quando o Lula se elegeu pela primeira vez, ele o fez após escrever a tal de "carta aos brasileiros", que na realidade, era uma carta aos bancos e ao nosso capitalismo de "novo capital improdutivo", que desde o governo FHC, vem sendo muito bem tratado com a chamada Lei de Responsabilidade Fiscal. Pois segundo a doutora Fatorelli, o pagamento dos juros da dívida pública não são tratados com o mesmo rigor quando o tema é responsabilidade fiscal. Por isso, mesmo com todas as contradições dos oito anos de governo Lula, ele não pôde ser vilipendiado, pois nunca os bancos ganharam tanto dinheiro, enquanto a classe média se divertia com a Bolsa Miami, com os financiamentos do BNDES e enquanto os mais pobres eram melhor atendidos e chegavam em maior número às universidades. Em um clima político como esse, como a mão que balança o berço da justiça brasileira poderia incomodar o governo Lula, apesar de todos os mensalões da vida?
Porém, a partir da segunda metade do primeiro governo da presidenta Dilma, uma crise econômica começou a bater na nossa porta, principalmente por causa da queda no preço das comodities no mercado internacional. E no segundo mandato desse mesmo governo, nós tivemos uma taxa selic que crescia de 7,25 para 14,25 ao ano. E por causa do pânico dos investidores, o Banco Central se sentia motivado a agir dentro dessas taxas, que segundo a doutora Fatorelli, se praticadas, derrubam qualquer economia do mundo. Nessa época, as empresas não investiam e as famílias consumiam muito menos. E como o que movimenta uma economia sadia é principalmente o consumo das famílias, a crise estacionou definitivamente no nosso território. Mas para que as empresas voltassem a investirr a as famílias retornassem ao consumo, Dilma Rousseff tentou interferir politicamente nas altas taxas de juros praticadas como taxa selic. Segundo a doutora Fatorelli, Dilma baixou a taxa básica de juros dos altíssimos 14,24 por cento para os também altíssimos patamares de anteriores, o que gerou todo um clima social e político contra a presidenta através das várias mãos econômicas que balançam o berço da nossa justiça sonolenta. E em pânico essa mão, com a tal ideia fixa de teto de gastos, que garante a valorização dos títulos da nossa dívida pública, tirou uma carta que estava debaixo da manga contendo um xeque mate, as "pedaladas fiscais." E isso foi possível principalmente por causa da chegada de um mais novo paladino da moralidade na política brasileira, o juiz Sérgio Moro e o seu principal aliado na suposta luta contra a corrupção, o procurador Deltam Dalagnol.
Moro chegou ao poder dando continuidade a um projeto udenista de classe média, que está sempre a procura de um único culpado sociólogico pelas nossas mazelas, a corrupção. Desta maneira, o juiz foi adotado também pelos principais setores da imprensa e das elites econômicas como uma espécie de super homem de Maringá, que nem a criptonita das gravações reveladas pelo site Intercept fizeram ele perder o grande prestígio que o mesmo goza nos principais setores da imprensa brasileira. Ou seja, Moro também cometeu várias e várias irregularidades, quiçá formação de quadrilha, uma vez que o seu ilícito frente à Operação Lava Jato foi feito sincronizadamente entre seus pares. Sem falar das gravações que também redundaram no impeachment da presedenta Dilma e no impedimento do Lula como seu ministro da Casa Civil, que também foram ilegais. Mas por que Moro, apesar de tantas contradições, possuí tantos prestígios e parece inatingível em relação à justiça? Também porque a mão que balança o berço da nossa justiça adormecida as vezes, e que hoje tem no teto de gastos o seu principal alircércere econômico, tem o apoio incontesti desse ex juiz, que a luz das nossas ideias de classe média, compreende que o combate à corrupção é o único projeto político a ser perseguido no país.
Após o impeachment da presidenta Dilma, o país continuou a ter as suas contradições éticas. O governo Temmer, que foi posto no lugar do governo anterior para reafirmar a frasezinha mágica, teto de gastos, foi um governo repleto de gedéis. Bolsonaro chegou ao poder, e pornograficamente, o ex juiz que prendera o principal adversário do Bolsonaro nas eleições de 2018, o Lula, foi convidado para ser o ministro da justiça do governo. E apesar de toda crítica dos principais setores da imprensa, dos principais investidores e da elite econômica à truculência incontesti do Bolsonaro, o seu impeachment não é conduzido a bom termo, pois Paulo Guedes, o seu ministro da Economia, também é um dos principais representantes da mão que balança o berço da nossa justiça as vezes sonolenta, justiça essa que orienta a frasezinha mágica, teto de gastos. É por isso que há tanta falta de critérios nessa tal luta moralista contra a corrupção. É por isso que o quase ministro Decoteli foi trucidado pela imprensa por causa dos problemas no seu currículo acadêmica, mas estranhamente, o ministro indicado pelo presidente Bolsonaro para ocupar a vaga de Celso de Melo no Supremo, não recebeu tantas críticas e tantos bombardeios assim por também ter mentido a respeito da sua real formação, pois o combate a corrupção aqui no Brasil, não tem um valor tão essencialista como aparece no nosso discurso, mas a corrupção só é levada em consideração no Brasil em grande escala, se ela estiver também relacionada aos nossos racismos, aos nossos preconceitos extruturais ou se o tal corrupto não atrapalhar muito a liberda de uma das principais mãos que balançam o berço da nossa justiça eventualmente adormecida, o teto de gastos.
Eldon de Azevedo Rosamasson
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