CRÔNICA E FILOSOFIA: SEM DEUS, SEM HONRA E SEM PECADO
Uma das cenas que, dentre tantas outras, mais me marcaram na História do Cinema, a princípio nem parece ser tão interessante assim. Se trata do momento em que o guerreiro troiano Heitor partiu para o confronto decisivo entre ele e o seu principal adversário, o grego Aquiles, onde o primeiro, antes de partir para o combate derradeiro, se despediu dos seus, sabendo que jamais teria condições de vencer o mais hábil guerreiro da sua época. Mas por que Heitor, apesar de saber que estava caminhando para a morte, não renunciou ao combate contra Aquiles? Isso se deu por causa de um simples substantivo, capaz de adjetivar com os maiores louros da vitória a um homem devidamente valoroso naquela antiguidade, a honra. Contrariamente a esse exemplo do mito grego, este caso onde um senador da república, Chico Rodrigues, foi flagrado com cerca de 34 mil reais introduzido entre as fronteiras da protuberância esquiática, é o cúmulo de uma pouquíssima vergonha histórica, que nós construimos no seio de uma cultura judaicocristã, que substitui a muitos e muitos anos, os conceitos de honra pelas ideias de pecado.
Já faz bastante tempo que eu considero o conceito de pecado como uma espécie de fratura antropologia frente a ética, sobretudo porque esse sentimento se vale especialmente de uma excessiva moralização ex machine da vida. Neste caso, se as razões que constroem o nosso comportamento devem ser mesmo orientadas por motivos que são da ordem do celestial, qual seria a nossa responsabilidade integral de homens e mulheres que somos, perante à criminalidade, perante à corrupção, e pasmem, perante ao que há de mais pornográfico frente ao que é explicitamente imoral hoje, onde a corrupção, que outrora trazia o objeto do desejo furtado para dentro do bolso de pessoas desonestas, onde a corrupção anteriormente dirigia para os interiores das peças íntimas dos indivíduos corruptos cada item furtado, mas agora simplesmente em um terceiro momento, conduz quantias indevidamente surrupiadas, para as fronteiras e para os interiores das protuberâncias esquiáticas de quem rouba o herário público?
A honra e o pecado não têm apenas uma "genealogia" de construção da sua moral, mas ambos possuem também uma geologia estrutural, programática e histórica com as suas próprias características. Quando samurais japoneses praticavam o arakiri com o objetivo de eliminação da sua vida em meio a um fracasso, eles estavam se posicionando pessoal e socialmente diante das próprias limitações. Igualmente, quando um guerreiro da cultura grega se suicidava por causa da possibilidade de se tornar escravo dos seus inimigos, era a sua honra que estava em jogo. E até hoje, quando jovens orientais se matam por não ter passado em um simples vestibular, ou quando um homem público faz o mesmo ao ser flagrantemente visto em atos de corrupção, é diante do seu próprio espelho moral que os mesmo são postos. Mas quando a honra é substituída pelo pecado, será por que nós temos muito mais dificuldades em nos colocar eticamente perante o nosso próprio espelho ético e moral, a ponto de sequer uma quantia extraída ilicitamente dos orifícios da vergonha alheia, ser capaz de constranger o praticante do ilícito, os seus aliados e parte considerável de uma militância política?
A honra para as tradições judaicocristãs, foram fundamentadas através de um conceito semitico e hebreu, que é o conceito de "varonilidade." Por isso a frase, "povo de Israel, portai_vos varonilmente." Porém o Deus dessa tradição não é historicamente um ser que se confunde com a natureza ao se apresentar aos seres humanos, pois Yavé é uma pessoa divina, ex machine e que habita os "altos céus." Neste caso, os próprios valores éticos e morais construídos a partir das nossas influências judaicas, promoveram uma moralidade que na realidade não está na natureza e não está em nós, e sim na ideias de que existe um ente divino, que é uma espécie de síndico da terra preocupado com os mínimos detalhes da vida das pessoas. Esse fenômeno antropofágico gerou evidentemente, uma ética da transferência, que faz deste homem celestial as origens da bondade e da maldade que existe nas pessoas. Mas e agora, em uma sociedade que vive as experiências da morte de Deus, principalmente desde as interferência de Galilei, de Darwin e de Freud? o que fazer agora com a ética da transferência, se Deus não está mais tão presente assim nas nossas consciências humanas, assim como ele esteve presente nas condições da humanidade no passado?
Uma das características de algumas tradições como a do Japão e como a da China, é que nesses lugares há fenômenos culturais sem o nosso Deus como necessidade histórica fundamental, ou seja, essss nações são ambientes culturais com bastante honra histórica, mas sem muita consciência de pecado. Tradições de países como os do Norte e do Oriente Europeu e como os Países Baixos, já são lugares que quando Deus chegou, o ele e o Cristo da tradição judaica, foram construídos edificados com o espírito guerreiro da honra, que já habitava por lá. Mas em lugares onde Jesus Cristo chegou meio atrasado como é o caso do Brasil, dos Estados Unidos e demais países do Centro, do Norte e da parte sul da América, as ideias de pecado apareceram por aqui muito antes da honra ser construída de forma definitiva. Um dos resultados disso, é que nessas tradições, e principalmente no Brasil, quando a consciência da morte de Deus chegou, nós ficamos sem ter mais para quem transferir as nossas responsabilidades para uma espiritualidade ex machine. E por isso ficamos sem Deus, sem honra e sem pecado. Até porque "se não há Deus, todo é permitido," caso nenhuma lei seja ontologicamente capaz de substituir Moisés e as doutrinas de Jesus. Razão pela qual a procura dos caminhos de uma honra perdida ou de uma honra de nova fundação ética é muito importante para nós.
A auxência da vergonha honrasa ficou explícita e evidente no caso em que o senador Chico Rodrigues foi capturado com dinheiro do combate a Pandemia entre as suas entranhas pudendas, pois além do mesmo jurar inocência e ainda contar com o apoio de parlamentares e militantes, em casos parecidos com esse no Brasil e nas tradições do pecado que cercam a nossa civilização, sequer o suicídio, que seria uma saída minimamente honrosa, mas não aconselhável é claro, é praticado, pois nós vivemos diante de uma cultura histórica de transferência de responsabilidade para Deus. Porém com a morte histórica do Soberano na consciência das pessoas após à modernidade, o céu dos homens ficou vazio. E agora, sem Deus, sem pecado e sem honra, sequer o dinheiro da saúde, com mais de 150 mil mortos face a uma pandemia, quando é retirado de dentro do regaço da vergonha alheia, é capaz de conduzir pelo menos alguns cidadão honrados ao suicídio. Não que eu o recomende isso, mas saberia compreendê_lo em um caso tão extremo como esse.
Eldon de Azevedo Rosamasson
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