CRÔNICA E FILOSOFIA: Bolsonaro e a sociedade do cansaço
Quando nós pensamos e nos referimos a Jair Bolsonaro, evidentemente, estamos tratando de um cidadão sem idoneidade em qualquer área do conhecimento formal. Mas apesar disso, eu penso que seja possível falar dele a partir de matrizes do pensamento filosófico, como fez o professor Paulo Guiraldeli no seu livro A Filosofia Explica Bolsonaro, pois apesar da sua completa inaptidão para a abstração intelectual básica, se ele foi eleito, é porque existe uma realidade histórica, sociólogica, antropológica e filosófica que que está envolvida na sua eleição e permanência no poder. Pelo menos até os dias de hoje. E é dentro desta perspectiva que eu vou discorrer sobre o Bolsonarismo e a sociedade do cansaço, que é uma obra que foi escrita pelo filósofo sul coreano Byung Shu Han.
O Bolsonarismo, apesar desse sufixo ismo, que geralmente se refere a uma escola filosófica, como é o caso do Liberalismo, do Socialismo do Existencialismo e etc, não se trata de qualquer forma de conceito filosófico, devido a sua total pobreza programática em termos de filosofia política. Ser um bolsonarista é antes de mais nada se habituar a um conjunto de práticas e de vícios políticos, que inclusive se modifica muito dependendo do momento político oportuno. Bolsonaro já elogiou o Chavismo na década de 90, mas hoje se posiciona contra o mesmo. Bolsonaro já se aliou ao petismo e navegou por um bom tempo na onda Lula, mas se elegeu principalmente a partir do crescimento do sentimento antipetista e através do discurso da anti corrupção. Bolsonaro já disse que o Bolsa Família é coisa de Comunista e que jamais ele faria aliança com corruptos, mas hoje também se utiliza do Bolsa para aumentar o seu capital político e está de beijos e abraços com o PTB do ex presidiário Roberto Jeferson. Mas apesar de toda essa contradição, Bolsonaro sempre investiu muitíssimo no obscurantismo, na anti ciência e no fanatismo moralista e religioso como base de apoio. Neste caso, ao refletir sobre esse movimento através da crítica da Filosofia, não é o Bolsonarismo que eu estou tratando como sistema filosófico, filosófica é a minha reflexão e a minha análise crítica sobre esse fenômeno.
Quando Byung Shu Han escreveu o livro A Sociedade do Cansaço, ele o fez comparando a sociedade dos nossos dias, a do Cansaço, com a da época da sociedade disciplinar, a qual foi teorisada por Foucault. Essa sociedade baseada na disciplina chegou ao Ocidente europeu em primeiro lugar nos idos dos séculos XVlll e XlX na esteira da Revolução Industrial. Pois quando a indústria passou, a partir dessa época, a ser a principal salvaguarda do economia capitalista, e os trabalhadores vieram em massa dos campos para as grandes cidades para trabalhar nas oportunidades de trabalho abertas pelo setor industrial, elas precisaram passar por uma rígida disciplina para se adequar a essa nova realidade trabalhista, pois uma coisa era a vida do trabalho no campo onde o dia a dia da produção era regrado pela natureza, por mais dura que a vida interiorana fosse. E outra coisa era o dia a dia dos trabalhadores na indústria, agora regrada pelo tempo cronológico. Desta maneira, a sociedade disciplinar pós industrial foi instaurada com um caráter totalmente coercitivo. E com isso, esse sistema disciplinar pós revolucionário levou a vigilância sistêmica para praticamente todas as instituição, para a Escola, para os presídios, para os manicômios e etc. Mas a sociedade do cansaço tem as suas próprias peculiaridades, uma vez que ela foi formada através de fragmentações no mundo do trabalho ocorridas com o surgimento e desenvolvimento do crescimento da economia Neoliberal, que atomisou e terceirisou por demais as atividades trabalhistas. Com os trabalhadores cada vez mais isolados e dependentes de si mesmo, o cansaço, que outrora era imposto pela vigilância extrerna da disciplina, passou a ser originada pela autocoerção de cada um que trabalha e se vê agora como o patrão e o empregado de si mesmo e como o opressor e o libertador de si mesmo.
A sociedade da disciplina realizou a tarefa de criar as suas próprias patologias, pois foi nela que Freud, no século XlX, criou a Psicanálise a partir das descobertas do inconsciente. E nesses dias a Psiquiatria dava os seus primeiros passos. E como Freud teorizou as suas ideias em pleno boom da sociedade disciplinar e a Psiquiatria surgiu também nesses tempos, pensadores como Byung Shu Han, Gilles Deleuze, Félix Guatari e outros, compreenderam que essa, e somente essa realidade, poderia fazer aparecer conhecimentos como a Psicanálise e a Psiquiatria, pois os efeitos psicossomáticos da sociedade da disciplina redundou no surgimento de loucos, neuróticos e histéricos. Mas contrariamente a isso, a sociedade do cansaço, também conhecida como a sociedade de positividade e de desempenho, fez aparecer outras formas de patologias e outros tipos de anomalias psíquicas, pois como nessa última sociedade o indivíduo se tornou o patrão e o empregado de si mesmo, o opressor e o libertador de si mesmo e simplesmente o empreendedor do seu próprio capital vital, essa sociedade produz o infartos psíquico de pessoas que se sentem fracassadas e deprimidas. Mas por que essa diferença? essa diferença ocorre também porque na sociedade disciplinar os indivíduos tinham tarefas definidas e cumprir sob os olhos da vigilância da supervisão. Mas na atual sociedade do desempenho, a tarefa jamais se conclui definitivamente, o que potencializa ainda mais não apenas o infarto psíquico gerador da depressão e do fracasso, mas principalmente a síndrome de burnolt, que ocorre exatamente pelas ansiedades hodiernas pelo próprio desempenho, que é o fenômeno causador do "infarto psíquico" motivado por essa sobrecarga muito comum a todo esse tipo de sociabilidade.
É dentro dessa perspectiva neoliberal que o mundo se direcionou, sobretudo a partir da década de 70 com o protagonismo da Escola de Chicago. Porém no Brasil essa tendência chegou por intermédio do governo Collor, avançou na era FHC, surpreendentemente se aprofundou nos tempos do PT, e hoje, se agudisa demasiadamente no governo Bolsonaro sob a supervisão desastrada do Paulo Guedes.
Uma das razões incontesti da popularidade, que levou Bolsonaro à presidência da república, também é a exploração dessa perspectiva sociólogica de que se todos podem ser de fato os patrões e os empregados de si mesmo, faz_se a seguinte pergunta? para que a população precisa de uma maior presença do serviço público e de muita supervisão da presença do Estado? Afinal de contas, estamos em uma sociedade de desempenhos individuais, e não em uma sociedade disciplinar. Porém o Bolsonaro, que é muito desastrado diga_se de passagem, faz o discurso caricato de uma economia neoliberalóide que ele aprendeu por tabela com o Olavo de Carvalho e com as perspectivas financista do Paulo Guedes, que sempre foi um especulador bem sucedido do mercado financeiro. E o que esse mercado financista pretende dentre muitas coisas? Essa economia quer também que a mais valia social seja supostamente economizada por causa de um suposto equilíbrio das contas públicas, que na mais pura realidade, é a manutenção políticas da suposta austeridade econômica baseada nesse tal de "teto de gastos", onde a finalidade principalmente é fazer com que os títulos da dívida pública se valorizem para favorecer a grupo social de onde o Guedes veio, os principais investidores e os grandes especuladores do mercado financeiro.
É por causa dessa sensação de liberdade quase absoluta perante o mundo da economia, do trabalho e da república, que Bolsonaro tem tanto apoio quando ele diz fala que os pais não tem que usar cadeirinha de bebê nos seus veículos se não quiserem, afinal de contas, segundo ele "nós somos livres." É por isso que Bolsonaro ainda tem apoio quando incentiva as leis de trânsito a não mais se utilizarem dos radares que supervisionam os limites de velocidade, afinal de contas, "somos livres." É por causa disso que ele ainda faz muito sucesso quando incentiva o livre acesso predador à terras indígenas e às florestas, afinal de contas, "somos livres." E mais ainda, é em nome dessa verdadeira caricatura da liberdade como ação política que Bolsonaro não usa, e incentiva às pessoas a não usarem máscara e a não se submeterem à vacina nenhuma. Afinal de contas, "somos livres. Porém agora, nessa nova fase da economia neoliberal, a mesma tem se desacelerado no mundo desde a crise de 2008, e tem se tornado totalmente insustentável com a presença da Covid 19, que o nosso presidente tem se comportado, não como um neoliberal à maneira clássica, mas sim como uma caricatura muito mau feita da economia neoliberal.
Eldon de Azevedo Rosamasson
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